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Arte do Aconselhamento Parte 2 - A PERSONALIDADE É DETERMINÍSTICA?




Freud até certo ponto roubou ao homem o luxo de ser hipócrita e desonesto – o que em parte explica porque ele vem sendo atacado tão violentamente. Mas Freud veio mostrar-nos que a personalidade é muito mais complexa do que nossos pequenos sistemas deixam transparecer. Ele descobriu que a “profundidade” da natureza humana estava contida nos domínios profundos e poderosos da inconsciência.

Na verdade,
Freud nos mostrou o lado feio da natureza humana. Se alguém ainda não acredita que a natureza humana tem um lado feio, que olhe apenas de relance para o estado de nosso mundo moderno devastado pela guerra, pelo predomínio de um em detrimento do outro, pela frivolidade diante da vida humana, etc.

Freud inventou um sistema para analisar a personalidade humana que ele chama de
“psicanálise”. Ele observou que os ajustamentos dentro da mente do indivíduo podem entrar numa desordem caótica devido a “repressões”. Essas repressões, na realidade, significam que o indivíduo está sendo desonesto consigo mesmo. O processo é mais ou menos assim: um impulso instintivo força a passagem do interior do Id (tendências instintivas do inconsciente) e busca expressão no mundo exterior. Mas o Ego (o nosso “eu” consciente) a meio caminho entre o Id e o mundo exterior, está ciente das proibições da sociedade contra a expressão desse desejo específico. Então ele recorre a algum ardil para reprimir o desejo, entrando em cena o Superego. O Ego diz a si mesmo (Superego) que não pode fazer tal coisa, que ao invés disto, é melhor fazer aquilo. Mas, esta repressão, quando feita com violência, pode ocasionar um efeito colateral, fazendo com que o impulso esforce-se para sair novamente, mas agora de outro modo – desta vez sob a forma de algum sintoma neurótico, como a ansiedade, o embaraço, ou o esquecimento, ou mesmo alguma forma mais séria de psicose.

Quando um paciente neurótico se submete a um tratamento com algum psicanalista freudiano, o analista faz com que ele verbalize suas associações mentais, o que significa, praticamente, falar a esmo. Durante essa “confissão”, como é chamada, o analista fica à espreita de sinais de alguma repressão, como a hesitação do paciente em algum ponto crucial, ou o esquecimento de algo, ou mostras de embaraço. Esses sintomas são as bóias que indicam a existência de conflitos psicológicos subjacentes. Torna-se, então, função do analista identificar esses conflitos, trazendo-os da inconsciência para a claridade e, o resultado visado é o desemaranhar da mente do paciente. O processo central da psicanálise consiste em retirar o conflito das trevas da inconsciência para a luz da consciência, onde ele pode ser reconhecido e razoavelmente manipulado. Como disse Freud: Nossa utilidade, consiste em substituir o inconsciente pelo consciente, em transladar o inconsciente para dentro do consciente”. O intuito do conselheiro, com isto, é levar o aconselhado a um Insight, que nos dá a fabulosa extensão e potência do reino do inconsciente.

A psicanálise também mostra que devemos levar em consideração muito mais coisas que simplesmente o ego consciente. Este pobre “general”, na realidade, tem pouco poder de decisão, pois é batido de um lado para outro pelas forças instintivas do Id, pelo mundo exterior e pelo Superego. A psicanálise freudiana prova que não podemos alcançar sucesso na vida moral através de um recurso tão simples quanto a mera repressão de qualquer tendência, que a sociedade, ou nosso próprio Superego, acha intragável.

Mas o perigo do sistema freudiano de análise surge quando ele é tomado como uma interpretação determinística da personalidade como um todo. O sistema pode, simplesmente, tornar-se um esquema de causa e efeito irrefletido e incondicional. A terapia tem muito mais aspectos criativos e consegue sucesso precisamente por não se prender, estritamente, à teoria da causa-e-efeito. Contudo, o perigo reside na influência da teoria freudiana ao construir uma visão determinística e mecanicista da personalidade na mente do público mal informado.

Certamente o sistema de causa e efeito é válido para certos aspectos da mente. Mas seria errado colocar a mente na camisa de força de uma teoria determinística, pois, o inconsciente não é tão previsível assim! Freud é seduzido pela sistematização prática e acessível da ciência natural no qual ele deita a personalidade humana e a obriga a adaptar-se. É claro que cogita-se que Freud viveu no período conhecido como “Racionalismo”, por isso pensava de tal forma.

Se um determinismo dessa espécie for aceito, a responsabilidade humana é destruída. O ladrão pode dizer, como observa Kunkel: “Não fui eu quem roubou a maçã, foi minha fome”. O que será do propósito da liberdade e da decisão criativa por parte do indivíduo?

Na verdade, um dos pressupostos básicos em toda psicoterapia é o de que o paciente deve, mais cedo ou mais tarde, aceitar a responsabilidade por si mesmo. O determinismo de causa e efeito só é válido para uma área limitada, ou seja, a neurose. Quando o paciente é libertado do complexo, torna-se responsável pela construção criativa de seu futuro.

As pessoas neurótica são exatamente aquelas que tendem a possuir uma perspectiva determinística da vida. Elas procuram culpar outra coisa qualquer por seus problemas. Isso é compreensível, pois se eles, apenas uma vez, admitissem sua responsabilidade, estariam forçados a tomar uma iniciativa no sentido de superar a neurose.

Quando a pessoa discute como se sua própria vida dependesse da discussão, você pode estar certo de que por trás de sua paixão existe mais do que um simples interesse objetivo pela verdade. Ele provavelmente estará tentando poupar seu próprio esquema neurótico de alguma perturbação.

Sim, é certo que o determinismo funciona em alguns casos, mas esses são casos de neuróticos. Neurose significa uma capitulação da liberdade, a submissão do “eu” a fórmulas rígidas de educação. Como consequência, a personalidade nesse ponto torna-se realmente uma máquina. Mas a saúde mental significa uma restauração do senso de responsabilidade pessoal e, logo, uma restauração da liberdade.



RESENHA CRÍTICA SOBRE: MAY, Rollo. A Arte do
Aconselhamento Psicológico. 3ª ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1979. Pp38-64.

Autor(a): PROF. JOSIAS DOS SANTOS BATISTA JUNIOR


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